quarta-feira, 30 de março de 2011

C P F

           O menino era muito pequeno, devia ter, no máximo, quatro anos. Um amigo muito próximo da família aconselhou seus pais a fazerem um plano de previdência privada para o pequeno e seus irmãos. Para agilizar o processo, tanta intimidade tinha, que mandou fazer o CPF das crianças, condição sine qua non para se fazer o tal plano.
            Pois muito bem, dia vai, dia vem e, a despeito de tanta modernidade, de repente, vão chegando, uma a uma, quatro cartas pelo Correio, endereçadas a cada uma das crianças da casa.
            Pra quem nasceu na era da internet, do cartão de banco, e do playstation, aquilo era pra lá de insólito, coisa nunca vista, até parecia ser da época do vinil, da fita cassete ou do projetor de super-8 do avô.
              Nesses tempos em que não se recebe mais carta de namorado nem de amiga estrangeira (aquelas, com direito ao deleite da espera e das provas materiais do remetente - seja a caligrafia, a textura do papel, o perfume, o selo ou o carimbo de origem, uma flor seca ou até uma borboleta dentro no envelope); e que só se recebe pelo correio aquilo que não se quer - propaganda,  jornal do bairro e contas a pagar- , uma carta com nome de criança é mesmo uma experiência singular.
           A mãe fez um certo suspense, aproveitando a oportunidade para ensinar. Curiosidade criada, o menino se aproximou e foi logo abrindo o envelope, com todo cuidado pra não rasgar o conteúdo. 
             Lá dentro não tinha carta, mas um papel bem dobrado, com um lindo cartão azul , aonde ele reconhecia seu nome completo e três grandes letras brancas formando uma sigla: C P F.
Como conhecia bem o alfabeto, mas ainda não sabia ler, foi logo perguntando: - "Mãe, o que é CPF?"
- Cadastro de pessoa física, respondeu a mãe.
          O menino ficou suspenso por um tempo, digerindo a informação. Aquele cartão parecia  ser mesmo algo muito importante. Talvez com ele pudesse tirar dinheiro na máquina do banco, e  então comprar picolé, figurinhas e um monte de gibis.
          O significado daquelas palavras era difícil de entender, mas o certo é que a partir daquele momento  algo parecia prestes a mudar definitivamente.
           Então, num lampejo, muito sério, disparou:
- Quer dizer, então, que já sou uma Pessoa Física?

3 comentários:

  1. Oi, Ana! Gostei muito do blog, forma e conteúdo(s). Li todos os posts "de uma vezada só", em um momento nada favorável para tanto, no meio de mil porfazeres - bom índice para ver o tanto que me capturou... Grato pelo bom momentos! Luzes para nós!
    - Seu primo Vini

    ResponderExcluir
  2. ...VOU LÁ CONFERIR, MAS ANTES QUERO LHE DIZER Q VC É MUITO PRECIOSA, QUE O SENHOR JESUS LHE ABENÇOE MUITO E Q VC CONTINUE SENDO A POESIA DELE
    BJS REGINA CHAVES

    ResponderExcluir
  3. Ler seu blog é como sentar para ver o pôr do sol num fim de tarde...
    descansar,
    relembrar que a poesia abranda a dor do dia dia,
    faz calar a alma,
    pausa para refletir,
    nutrir a força que acalma,
    poética e profética,
    para amanhecer um dia melhor.
    Obrigado por apesar de longe, estar aqui tão perto, com palavras vivas.
    Eliz

    ResponderExcluir